Laura Nash Especialista americana critica falta de ética nas empresas. |
Não existe a ética nos negócios. Existe apenas um tipo — você tem de seguir os padrões mais altos.
(Marvin Bower, ex-sóciõ-gerente da MacKinsey
& Co. Citado em “Wisdom from the Giants of Business” de Walter Guzzardi,
Revista Fortune, 3 de julho 1989, p. 81.)
Depois de oito anos da sua primeira visita à PUC, Laura Nash, ex-professora de Harvard e sócio-fundadora da Piper Cover Fund Asset Management, deu uma palestra no dia 30 de março sobre ética empresarial. A discussão foi em torno da crise econômica mundial, desde o seu histórico até possíveis soluções. Laura, que também é autora do livro Just Enough, foi convidada pelo departamento de Filosofia da Universidade, que teve o patrocínio do Consulado Americano.
Laura indicou três fatores que devem ser levados em conta para evitar novos erros no mundo financeiro. Primeiro, é entender o que a ética diz da crise, segundo, o que a crise diz sobre a ética e, terceiro, o que ambas dizem sobre a responsabilidade social nas empresas. “Esta não é a hora para ganância”, diz, apontando a avidez pelo lucro como a principal razão para o início da crise.
Embora muitos líderes corporativos defendam a necessidade de
altos padrões éticos nos negócios, tem sido muito difícil encontrar o
vocabulário e os termos certos para descrever a dimensão moral da administração
empresarial. Como indica a afirmação de Bowers, termo ética nos negócios pode ser repulsivo. Para ele e para outros, isso
sugere a ideia moral de aceitar um padrão duplo —uma ética para a vida
particular e outra para as decisões dos negócios. Para outros, a ética nos
negócios sugere uma jocosa contradição de termos.
Assim, embora muitos homens de destaque expressem a
necessidade de padrões morais fortes nos negócios, até agora têm havido poucas
harmonizações verbais entre administração e moralidade. O que queremos dizer
com os termos integridade e padrões mais altos de conduta? Esses conceitos, que
em geral são óbvios, realmente merecem pouco destaque quando os executivos
precisam confrontar-se diariamente com as numerosas áreas cinzentas do comportamento
empresarial? Seria suficiente destacar o que uma pessoa não deve fazer e deixar
o resto por conta do instinto pessoal?
É óbvio que não, pois, os executivos enfrentam regularmente decisões que não
têm demarcações óbvias entre o certo e o errado. A conduta moral nos negócios
merece a mesma atenção sistemática que qualquer outro aspecto da administração.
Até aqui, porém, tem havido pouca ajuda nessa área. A análise filosófica e
teológica formal não encontrou formas de traduzir as preocupações da alma para
a linguagem do livro de bolso.
Essa falha não surpreende. Ambos os campos vêm desprezando a
discussão dos negócios há milhares de anos. A Bíblia adverte sobre servir aos
bens materiais. Até Aristóteles, há mais de dois mil anos, considerou, a
princípio, a pessoa de negócios como um possível objeto ao seu trabalho sobre
ética aplicada, mas depois rejeitou totalmente a ideia, com base no fato de que
os propósitos e a mentalidade do comerciante ou mecânico vulgar não eram
suficientemente bem- intencionados para merecerem uma análise moral séria. (Eudemian Ethics I.IV.2.)
Quanto a nossas respostas instintivas, a ideia de uma vida de
integridade nos negócios simplesmente não faz sentido para a maioria das
pessoas. Em nossa cultura, é fácil imaginar um doutor heroico arriscando sua
própria saúde para tratar dos doentes. Ou um heroico advogado defendendo, à
custa de sua própria carreira, o direito de um cliente pouco popular ter um
julgamento justo. Nem é forçada a imagem de um professor conduzindo a sua busca
da verdade, arriscando-se a ser ridicularizado.
É muito mais difícil idealizar um executivo estereotipado
ganhando dinheiro nobremente. E, quando médicos ou professores começam a
revelar motivações financeiras, eles são firmemente submetidos ao mesmo cinismo
social. Philip Caldwell, ex-presidente da Ford Motor Company, comentava essa
visão definitivamente suspeita da moralidade nos negócios quando dizia: “Muita
gente pensa que, se você é uma pessoa de negócios, deve automaticamente ser
gananciosa e desonesta. Eu acho essa visão repugnante”.
O campo da ciência da administração, embora não tão
abertamente cínico sobre a moralidade executiva quanto à mídia, tem, no
entanto, exibido uma carência semelhante de clareza intelectual em relação à
aplicação específica dos padrões éticos na solução dos problemas normais nos
negócios. Os valores pessoais são reconhecidos como importantes, mas como se
traduz em substância dos sistemas impessoais de administração? A maioria das
declarações de objetivos empresariais é, em sua natureza, funcional e mais do
que ética. Ducker, por exemplo, tem descrito o objetivo geral da empresa como
sendo “a utilização produtiva de recursos que geram riquezas” (Peter F. Drucker. Management. (New York: Harper’s Coliege
Press, 1977), p. 62. Outros assumem que “a produção de eficiência cada vez
maior” é o objetivo geral da empresa, ao menos em um sistema capitalista democrático.
Muitos outros analistas dos negócios descrevem os componentes essenciais da
empresa em termos abertamente funcionais ou em termos de “excelência”, sem
nunca definir o objetivo geral que se visa com tais atividades.
Ver, por exemplo, Tom Peters e Robert Waterman, In Search of
Excellence (New York: Harper & Row, 1981), que está estruturado sobre os
sete componentes “S” de McKinsey para a empresa e nos oito atributos da
excelência. Kenneth Andrews, em seu texto clássico de administração sobre
estratégia corporativa, começa sua análise com uma definição não da empresa, mas
da administração, que é claramente funcional, porém, não claramente social: “A
administração pode ser definida como a direção da conduta bem-informada,
eficiente, planejada e objetiva da atividade organizada complexa”. (The
Concept of Corporate Strategy. ed. rev.[Homewood, IL: Richard D. Irwin, 1980],
p. 2.). Anteriormente, Chester Barnard (The Functions of the Executive
[Cambridge MÁ: Harvard University Press, 1938]) e Philip Selznick (Leadership
in Administration: A Sociological Interpretation. [Berkeley:
University of California Press, 1984]) já haviam alterado a definição de
administração da definição impessoal de “uma delegação do proprietário” para um
contexto mais social. O que eles não fizeram, porém, foi descrever o propósito,
mas sim a função. Ver, por exemplo, Barnard, p. 18. “Ela [a responsabilidade da
administração] é a responsabilidade pela contribuição. É a função, e não o
poder, que deve ser o critério de distinção e o princípio da organização.
Tais afirmativas dificilmente se constituem em farol para
orientar a integridade pessoal do administrador pelas águas perigosas do
materialismo e da eficiência. Sem uma ampla compreensão de como os valores
particulares e os objetivos institucionais se relacionam ou deixam de se
relacionar, a alegação de que a ética empresarial é simplesmente uma questão de
boa consciência é bastante inútil e mesmo enganosa. Por outro lado, a natureza
moral dos negócios não é adequadamente abordada pelas simples descrições das
funções organizacionais ou econômicas. Aprendemos que a empresa é um conceito
legal, definida como uma entidade legal, mas, na prática, ela é também uma
entidade social. Ela é uma organização de pessoas em que as ações de uns têm
efeito sobre o bem-estar e os direitos dos outros.
Alguns têm argumentado persuasivamente que a natureza de um
indivíduo é também essencialmente social, se não por outro motivo, pelo fato de
que a própria vida da pessoa é o produto da união de duas pessoas. Ver,
por exemplo, F. H. Bradley. “My Station and Its Duty”, Ethical Studies. 2 ed. (Oxford: Clarendon Press,
1927). O ponto que quero destacar aqui é que, enquanto os indivíduos parecem
ter uma mistura de privacidade, separatismo e sociabilidade, nada em uma
empresa escapa ao contexto social.
SUBINDO NA CURVA DO APRENDIZADO MORAL
Embora seja difícil criar uma ponte entre a discussão
tradicional da consciência particular e a discussão da ciência da
administração, a jornada deve ser empreendida. A moralidade é um fato
inevitável da vida gerencial, cujos problemas devem ser analisados de forma sistemática.
Quase toda decisão e atividade empresarial têm um aspecto ou
uma relevância moral inerente. Muitos deles são variações sobre a qualidade da
confiança. Uma transação financeira, por exemplo, não pode ser feita sem o
estabelecimento de diversos mecanismos de confiança: deve-se confiar na
manutenção da palavra dos negociadores, os preços cotados devem ter alguma
relação com os preços cobrados; deve-se confiar nas controladoras para manter
registros precisos daquilo que é feito, por quem e por quanto. As decisões de
produto exigem que pessoas façam avaliações de qualidade e eficácia, que
dependem de sua honestidade e precisão. Sistemas complexos de serviços e
transações exigem trabalho de equipe eficiente, que não pode ser obtido sem cooperação,
o que, por sua vez, não pode ser conseguido, mesmo quando imposto por leis, sem
que haja confiança e respeito mútuo entre os parceiros. Se um empregado não vê
cuidado da alta administração da empresa por ele (ou ela), é improvável que ele
(ou ela) se preocupe em negociar meticulosamente em nome daquela administração.
Se não se pode confiar nas outras unidades da empresa para contar a verdade dos
fatos e receber somente os créditos merecidos, então por que insistir em
padrões pessoais de honestidade, a menos que levem a uma retribuição
demonstrável?
Amitai Etzioni expressou o aspecto fundamentalmente moral dos
negócios de forma eloquente:
A confiança, obviamente, é fundamental para a
economia, e não meramente para as relações sociais, uma vez que, sem ela, a
moeda não será usada, poupança não faz sentido e os custos das transações sobem
precipitadamente; em resumo, é difícil conceber uma economia moderna sem um
forte elemento de confiança que a permeie por completo. Amitai Etzioni. The
Moral Dirnension: Toward a New Economics. (New York: Free Press, 1988), p. 8.
Avançando além da ética da confiança, da qual as atividades
gerenciais dependem, pode-se ver que os administradores também tomam decisões
que produzem resultados morais. A maioria das atividades empresariais tem
impacto sobre outras pessoas e está, portanto, inerentemente sujeita a questões
sobre o bem ou mal que, em última análise, faz.
Sabemos que tais questões, longe de serem uma tendência, são
pelo menos tão antigas quanto os sumerianos, que viveram há cinco mil anos. A
própria escrita, uma das invenções mais importantes da história da humanidade,
foi desenvolvida em parte como resposta a um problema de ética nos negócios. As
longas distâncias e os perigos das grandes rotas comerciais ao longo do Rio
Tigre e Eufrates criaram novas dificuldades para garantir o pagamento e a
entrega dos bens vendidos. Os sumerianos desenvolveram as primeiras formas
rudimentares de escrita para registrar atividades comerciais em tabuletas, para
que as transações distantes pudessem ser realizadas em um ambiente de confiança
e responsabilidade mútua. Depois que esse ambiente surgiu, as empresas
comerciais e o comércio explodiram. As tabuletas de argila possibilitaram a
taxação, o inventário e as transações, formando a base econômica e
institucional da primeira grande civilização ocidental.
Embora o impacto histórico da “ética nos negócios” seja, sem
dúvida, consideravelmente menor do que aquele da invenção da escrita, a atual
tendência da ética nos negócios testemunha o fato de que as pessoas ainda são
atormentadas pelos aspectos morais na vida dos negócios e ainda estão
procurando respostas adequadas para os desafios práticos que esses problemas
geram. Como ilustra o exemplo dos sumérios, não existem divisões claras entre
os aspectos morais, econômicos e sociais dos negócios. A ética nos negócios
tende a abranger todas as três áreas do pensamento crítico. Vai-se, sem restrição,
dos sistemas macroeconômicos do capitalismo para as questões do comportamento
organizacional da administração e para os valores pessoais e particulares que
são muito caros aos indivíduos.
Além disso, apesar do ceticismo muitas vezes justificado, há
razões para assumir que esses valores e resultados podem ser submetidos a uma
análise coerente, pelo simples fato de que eles encontram expressão coerente
nas ações diárias. Mesmo sem o auxílio de Aristóteles, o pessoal das empresas
consegue atingir resultados éticos. As obrigações contratuais são cumpridas e
controles precisos são estabelecidos a cada dia. Muitos produtos satisfazem o
cliente. Muitos locais de trabalho fornecem aos empregados salário justo e um
senso legítimo de valorização. E existem muitos líderes de negócios, do
lendário Thomas Watson da TBM a Don Seibert da J. C. Penney, cujo compromisso
com uma carreira nos negócios foi marcado por uma integridade pessoal
excepcional, pelo sucesso da empresa e pelo serviço prestado ao público em geral.
RESPOSTAS TRADICIONAIS
PARA A RESPONSABILIDADE ÉTICA NOS NEGÓCIOS
Mas como o gerente com boa consciência aborda a ética nos
negócios hoje em dia? Como surgem as heróicas assertivas de moralidade nos
negócios, com a resolução da crise do Tylenol na Johnson & Johnson?
Resposta 1. Confiar no
Instinto
Existem muitas formas dos executivos responderem à
infiltração das questões morais no trabalho. Uma é confiar em seu “instinto” e
não tentar articular o problema mais ainda. Em muitas questões éticas, tal resposta
é mais ou menos tão eficiente quanto uma aspirina no caso de um acidente de
carro. O instinto sozinho dificilmente vence as complexidades morais dos PACs, (PAC: Political Action Comittee, forma legal
nos EUA, pela qual grupos empresariais dão apoio financeiro a partidos
políticos. [N.T.]) dos testes aleatórios de uso de drogas, das defasagens
salariais, ou da responsabilidade pelo meio ambiente.
O instinto também não dá ao executivo uma expressão vocal
adequada para a liderança ética em uma grande organização. O instinto de todos
não se baseia no mesmo conjunto de valores e opções. O desconto empresarial de
preço que uma pessoa dá a um cliente favorecido pode ser a definição que outra
pessoa tem para um suborno. O executivo A pode repudiar a sugestão de que a
empresa use informações ilegalmente conseguidas, de propriedade de um
concorrente, enquanto o executivo B pode achar que se trata simplesmente de
obter a proverbial vantagem competitiva. Apelar meramente para o instinto como
orientação do modo como uma empresa faz negócios não vai garantir a
unanimidade, nem mesmo a sensibilidade, quando as opções entre a integridade e
o lucro fácil tornam-se difíceis.
O instinto também tende a perder seu poder à medida que um
indivíduo integra-se ao sistema de valores de uma organização. A história tem
mostrado que os indivíduos podem fazer opções bastante diferentes quando agem
juntos, como um grupo. Alguns dos indivíduos mais admirados de Wall Street
comercializaram informações internas, prejudicando as contas de seus clientes;
executivos que presumivelmente eram bons pais de família falsificaram
sistematicamente relatórios de acidentes em diversas usinas nucleares em toda a
América; executivos de uma grande empresa processadora de alimentos que frequentavam
igrejas não apenas deixaram de investigar indicações claras de que seu “suco de
maçã” concentrado era 100% químico, como mais tarde enviaram caixas do coquetel
químico para Porto Rico, tentando fugir do controle da FDA (Food & Drug
Administration — órgão do governo norte-americano que controla e autoriza a
produção e venda de alimentos e produtos farmacêuticos. [N.T.]) e vender o
produto apesar de tudo.
A falibilidade é uma condição humana à qual os executivos são
vulneráveis como todo o mundo. Como observa Kenneth Andrews em seu prefácio no
livro Ethics in Practice, a ética nos
negócios é “um problema que alcança não apenas alguns criminosos exilados ou
velhacos em formação, mas também todo um exército de pessoas aparentemente
boas, que levam vidas privadas exemplares, ao mesmo tempo em que escondem
informações sobre produtos perigosos ou letais, ou falsificam registros de
custos”.(Kenneth R. Andrews. ed. Ethics in Practice: Managing
the Moral Corporation. (Boston:
Harvard Business School Press, 1989), p. 1.) Mesmo que não houvesse outro motivo
além da fragilidade do julgamento humano — especialmente quando confrontado com
a perspectiva de ganhar rios de dinheiro —, a abordagem pelo instinto não é uma
resposta moral adequada para os dilemas éticos e para as responsabilidades da
liderança nos negócios.
Resposta 2. Definindo
os “Nãos”
Uma segunda abordagem para os assuntos morais nos negócios é
a técnica dos mandamentos. As atividades empresariais estão sujeitas a uma
série de “o que não fazer” sobre tópicos específicos, com freqüência na forma
de legislação ou código de acatamento ético: Não ter conflito de interesses;
Não mentir; Ser honesto e objetivo ao manter os registros; Evitar o
envenenamento de seu cliente; Não poluir o meio ambiente; Não oprimir as
minorias; Não molestar as mulheres; Não vender a empresa ao especulador
imediatista; Não colocar a mão na caixa registradora.
Tais princípios são companheiros conhecidos pela maioria das
declarações de política corporativa. Contêm orientações importantes para o
comportamento extensivo ao grupo, mas são limitados por seu próprio
pontualismo. Por exemplo, uma orientação rígida que proíba os compradores da
empresa de aceitarem presentes de valor acima de US$25 pode evitar o suborno
desenfreado, mas não garante que um comprador exerça seu julgamento de compra
com prudência em vez de preconceito. Pode não haver dinheiro por debaixo dos
panos, e mesmo assim um comprador ainda pode ser seduzido por toda sorte de
apelos e incentivos de vendas para comprar um produto ou serviço sem uma
consideração honesta e responsável de sua equação final para a empresa. Além
disso, nenhuma política de conflito de interesses ou de manutenção de registros
evitará que o mesmo executivo disfarce as informações para fazer com que suas
decisões de compra pareçam melhores do que realmente são.
O executivo que desenvolve uma série de “nãos” específicos
como forma de liderança ética dentro de uma empresa logo descobre que há sempre
alguém que pode encontrar um meio de contornar as regras, ou que se
desenvolveram condições de mercado que não foram previstas pelas regras. Isso
não significa que as regras não sejam importantes, mas somente que, por conta
própria, elas não abordam toda a gama de problemas éticos com os quais um
executivo se confronta. Como se diz, quando o assunto é integridade pessoal, a
lei é melhor interpretada como piso do que como teto.
Resposta 3. Articular
Explicitamente uma Filosofia de Negócios
Um terceiro modo de abordar as questões morais dos negócios é
estabelecer um conjunto amplo e explícito de padrões éticos — e não apenas
proibições — que digam respeito aos objetivos da empresa e aos meios pelos
quais os indivíduos devem executá-los. Aqui, podemos aprender muito com o líder
empresarial japonês que considera a publicação de uma “filosofia pessoal de
negócios” requisito essencial do primeiro escalão da empresa. Essas declarações
não tratam das preocupações morais isoladas na abstração. Ao contrário, elas
descrevem os padrões de negócios da empresa em termos integrados: elas combinam
o compromisso moral pessoal da administração com os objetivos econômicos e os
valores culturais. Do ponto de vista prático de como um executivo realmente
pensa, “ser honesto”, “se divertir”, “ser inovador” e “obter um retorno sobre
investimento do mais alto nível” são todas expressões relacionadas entre si.
Tal estado de espírito pode ser chamado de filosofia ou
simplesmente “fundamentos”. O que tudo isso expressa são os compromissos que os
executivos sentem serem possíveis ou impossíveis para si próprios e para sua
empresa. À medida que os acionistas tornam-se mais agressivos nas suas
expectativas, e o local de trabalho se diversifica mais, a articulação desses
compromissos com antecedência torna-se cada vez mais importante.
Muitos dos presidentes de empresa citados neste livro acham
que oferecer uma liderança visível e direta, ao articular qual é “a razão de
ser da empresa”, através de um credo ou de uma declaração de missão, é uma
responsabilidade fundamental da administração. Outros acham que tais valores
deveriam ser comunicados informalmente. Independentemente da forma que assuma,
a exploração sistemática daqueles valores, objetivos e resultados que descrevem
“a razão de ser da empresa” ou “quem ela é” é o primeiro passo para dar aos
dilemas morais da empresa uma solução responsável.
DANDO O PRIMEIRO PASSO
Depois de defender a aplicação do senso pessoal de ética nas
questões problemáticas dos negócios, é útil articular as características gerais
que definem a administração “ética” e “responsável”, para fundamentar desde o
início a discussão. John L. Casey, diretor administrativo da Scudder, Stevens
& Clark, escreveu um excelente livro sobre questões éticas para o gerente
financeiro. [John L. Casey. Ethics in The Financial Marketplace. (New York: Scudder, Stevens &
Clark, 1988.)] No início do livro ele observa que a palavra ética pode, por si
só, ser um “engodo”. Com isso, concordariam vários executivos que já buscaram
um título interessante para um seminário sobre ética nos negócios. Outras
palavras para moralidade nos negócios são igualmente problemáticas. Como um eco
da antiga nobreza, a agora clássica descrição de administração de Chester
Barnard, As Funções do Executivo, fala da moralidade do gerente eficaz em
termos como previdência, propósitos duradouros e ideais elevados. (Barnard.
The Functions of the Executive, p.
282.)
A meu ver, o termo mais útil para descrever a tomada de
decisão ética não é a ética nos negócios, mas, sim, a integridade nos negócios. Don Seibert, da J. C. Penney, utiliza-o
no título de seu livro sobre ética nos negócios. Os professores de
administração Joseph Badaracco e Richard Ellsworth proclamam que a integridade
é a responsabilidade última da liderança empresarial; Tom Peters cita a
integridade como condição essencial e última da administração da mudança. (Donald
V. Seibert e William Proctor. The Ethical Executive. (New York: Cornerstone Library,
1984); Joseph L. Badaracco, Jr e Richard R. Ellsworth. Leadership and the Quest
for Integrity. (Boston: Harvard Business School Press, 1989); e Tom Peters. Thriving on Chaos. (New York: Harper
& Row, 1987), pp. 45-46.) Quase todos os documentos sobre ética nos
negócios citam a integridade como componente essencial da boa prática dos
negócios.
O que significa integridade? O que ela descreve? Em nossa
sociedade pluralista e individualista, esse é um conceito problemático,
semítico, ou existe um conjunto de valores tradicionais que as pessoas em geral
utilizam para descrever o comportamento ético? O ex-presidente da Johnson &
Johnson, James Burke, tem proclamado frequentemente que o Credo da empresa
descreve “o denominador comum” no qual todos podem acreditar. Ele está certo?
Existe um acordo sem controvérsias sobre ideais morais ou um executivo deve
recorrer a definições filosóficas fortemente fundamentadas para analisar a
ética e a administração?
Pesquisei os valores pessoais de, literalmente, milhares de
executivos de todos os níveis e descobri que Burke, sem dúvida, está certo.
Existem determinados valores que movem o idealismo das pessoas com regularidade
inexorável. “O que o move?” — perguntei aos executivos. “O que é indispensável
para a sua vida, para que você ainda seja capaz de se olhar no espelho?” Com
pouca variação, eles expressaram o mesmo conjunto de valores:
Honestidade
Integridade
Respeito pelos outros
Respeito próprio
Família
Realização
Confiabilidade
Justiça
Lealdade
Amor, religião e trabalho duro também são citados com
regularidade, quando não com unanimidade.
Com exceção, talvez, de ser limpo e alegre, a lista acima
parece muito com a lei dos Escoteiros ou com o Teste Quádruplo de Herbert R.
Taylor, que foi adotado pelo Rotary Club. (O Teste Qudrup1o do Rotary diz: 1.
Isso é a VERDADE? 2. Isso é JUSTO para todos os envolvidos? 3. Isso vai
construir a BOA VONTADE e MELHORES AMIZADES? 4. Isso será BENÉFICO para todos
os envolvidos?) E esse é o ponto. Não são conceitos místicos, mas parte de nossas
descrições diárias e de bom senso do que constitui a integridade pessoal. Quando
faço a mesma pergunta a grupos de estudantes, a maioria esmagadora cita os
mesmos valores como ideais. (Minha experiência é que, apesar de muita evidência
em contrário em termos de comportamento, poucas pessoas colocam ganhar dinheiro
e posses materiais em uma lista de valores ideais. Por outro lado, pesquisas
anuais do Conselho de Educação Superior revelaram que os universitários não
hesitam em citar o materialismo ou a ambição na carreira como um de seus
principais objetivos pragmáticos).
Por outro lado, a concordância sobre os ideais não significa
concordância sobre sua aplicação. O aborto, por exemplo, pode ou não ser
considerado um ato de justiça, amor ou respeito pelos outros. O trabalho duro,
quando em excesso, pode ser considerado como danoso à família, muito embora sua
intenção seja a expressão de um compromisso. A honestidade à custa de carreira pode
ou não ser vista como uma barganha aceitável.
Mas é importante notar que, apesar de não haver acordo nas
aplicações específicas, os termos têm significado. O idealismo ético não é
totalmente relativo, mesmo em uma América pluralista. Os diversos grupos que
pesquisei nunca sugeriram que seus ideais éticos centralizavam-se, digamos, no
hedonismo sádico, na exploração desenfreada ou na discriminação violenta. Muito
embora tais valores, às vezes, influenciem o pensamento gerencial, eles não são
aclamados como atos de integridade.
MARCAS DA INTEGRIDADE
NOS NEGÓCIOS
Nessas bases, é possível usar essa lista de valores como
ponto de partida de minha discussão. Depois de ter trabalhado com cerca de
duzentos códigos de ética corporativa reunidos pela Business Roundtable, depois
de entrevistas com, literalmente, milhares de executivos, após analisar artigos
pró e contra as empresas na imprensa em geral, eu sugeriria que, de forma
geral, os mesmos padrões de decência conduzem as definições de nossa sociedade
para a integridade nos negócios. Assim sendo, uma descrição geral da
integridade nos negócios compreenderia os seguintes valores básicos.
•
Honestidade
— precisão ao avaliar e representar a empresa e qualquer atividade relevante
para ela.
•
Confiabilidade
— ser consistente nas ações com os valores que se defende. Isso implica desde
cumprir consistentemente as alegações do seu produto até punir os empregados
que não honram os padrões que você alega serem integrantes da empresa.
•
Justiça
— equilibrar os direitos dos diversos grupos com consistência e boa vontade.
Embora as empresas divirjam fortemente quanto aos limites de sua
responsabilidade para com seus parceiros em relacionamentos não-comerciais,
parece haver mais consenso sobre as manifestações comerciais da ética: justiça
significa adotar uma ética que não tenda totalmente nem para o comprador nem
para o vendedor. Em vez de assumir responsabilidade exclusiva por todo
resultado não previsto de uma transação, o vendedor aceita a responsabilidade
de manter as promessas específicas feitas clara ou implicitamente aos clientes
e empregados.
•
Pragmatismo
— dar contribuições concretas para a contínua saúde financeira e organizacional
da empresa.
Essas quatro marcas da integridade nos negócios cobrem uma
abundância de assuntos éticos dentro do bom senso. As três primeiras previnem a
falsidade, o dano intencional, o favoritismo, o conflito de interesses e a
recusa de responsabilidade pelos erros. A última evita todas as formas de crime
do colarinho branco, ineficiência e desperdício. Também evita a filantropia
desenfreada e, a meu ver, implica alta qualidade, pois não há uma empresa no
mundo que possa comercializar a má qualidade sem comprometer sua honestidade.
Mesmo que não haja dano envolvido, uma empresa que encobre ou ignora a má
qualidade não tem opção a não ser mentir em sua apresentação ao público e aos
acionistas, deixando, assim, automaticamente, de preencher as condições da
integridade.
O mais importante é que a integridade é uma condição que
exige que você aja como diz. No fundo, significa vivenciar o que se defende
como certo. Significa que outras pessoas podem contar com você para manter
padrões de honestidade, justiça e prudência financeira mesmo quando as coisas
ficam difíceis.
Outro modo de entender o significado da integridade nos
negócios é submeter suas opções e seus hábitos a dois testes:
1. Essas decisões contribuem para a boa reputação de uma
empresa ou de um administrador?
2. Essas decisões promovem a confiança?
As duas questões estão, obviamente, inter-relacionadas.
Juntas, descrevem o ponto de referência principal para criar negociações
bem-sucedidas, a cooperação bem-sucedida e os mecanismos de investimento
bem-sucedidos. Quando a exploração dos assuntos éticos começa a criar mais
calor do que luz, as duas questões, reputação e criação de confiança, podem
ajudar a colocar a discussão de volta nos trilhos.
Acima de tudo, as condições descritas nas duas questões e
sugeridas como marcas da integridade nos negócios não são contrárias aos
valores usados pelos executivos para definir a integridade pessoal. Como tal,
sua criação constitui um primeiro passo para acabar com a ideia de que “a ética
nos negócios é uma contradição de termos” que tem impedido tantas tentativas de
alcançar a compreensão gerencial nessa área.
Referência
NASH,
Laura L. Ética nas empresas: guia prático
para soluções de problemas éticos nas empresas. Tradução: Kátia Aparecida
Roque. São Paulo: Makron Books, 2001. ( 2º capítulo)
Texto
indicado pela Professora Sueli Rodrigues
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